No primeiro episódio da sétima temporada de The Walking Dead, espectadores curiosos sobre a vítima de Negan tiveram o maior choque de realidade que a série já preparou. Nem mesmo a morte de Shane e Lori teve tanto impacto quando ambos eram tão importantes quanto você-sabe-quem quando morreram. Não é a relevância do personagem que define o impacto da morte sobre o espectador e sim, bem, o choque de realidade.
Pois bem. Odiar Negan pelo que fez sem odiar Rick pelos mesmos motivos beira a hipocrisia. Rick é, também, um vilão. Obviamente, o espectador tende a ficar ao lado de Rick por conhecer suas motivações, como ele chegou ali, proteção à sua família, Judith e blablablá.
Mas veja:
As duas cenas mostram como os dois grupos tratam de eliminar seus inimigos. Não é por acaso que há o mesmo posicionamento de câmera mostrando Rick e Negan em assassinatos semelhantes. Na quinta temporada, Rick dilacera Gareth dentro da igreja enquanto o canibal implora por misericórdia. Rick rebate dizendo que não poderia deixá-lo vivo, pois supostamente Gareth, em seu novo modo de sobrevivência, faria o mesmo com outras pessoas. O grupo de Rick promove a chacina ali mesmo. Abraham ESMAGA a CABEÇA de um deles com a coronha de sua arma e Sasha mata outro com várias facadas. Glenn, Maggie e Tyreese ficam à distância, assustados com tamanha violência.
Mesmo as ações seguintes de Rick em Alexandria sustentam que ele busca através da força colocar o seu modo de sobrevivência. A diferença entre Rick e Negan é, até aqui (S07E01) o sadismo do segundo. Embora seja mais comedido que outros antagonistas que surgiram na série, Rick é tão violento quanto e são fatores externos (sobretudo os filhos) que o impedem de chegar ao seu estado de natureza.
Ponto importante desse choque de realidade: quando descobrimos a escolha de Negan, sentimos alívio. Certo? Não era o nosso preferido mesmo… e em seguida tomamos a porrada. Que coisa, não?
É um excelente roteiro aliado a uma montagem espetacular.
Os roteiristas de TWD são habilidosos ao espalhar pistas interessantes sobre outros personagens e, assim, permitir que tenhamos um mínimo de empatia com aqueles grupos que ameaçam os “bonzinhos” da série. Por exemplo: ainda lá na quinta temporada, Tyreese fica com Judith e Martin em uma cabana. Martin mostra o quanto está cansado da matança e pede a Tyreese que fuja com Judith ou terá que matá-los até o final do dia. Exatamente o mesmo conflito interno que Carol passa a enfrentar na sexta temporada e que é, sem dúvida, o estopim para o encontro de todos com os Salvadores – afinal, Daryl parte para encontrá-la e os demais vão atrás.
Por falar em Salvadores, não é essa a mesma proposta de Rick cada vez que encontra uma comunidade mais fraca? The Walking Dead me desperta para essa reflexão: Negan determina que metade seja dele e tudo fica bem pra todo mundo. Ele provê segurança sobre outros grupos que ameacem suas comunidades. Rick fez o mesmo em Alexandria. Sob o discurso de manter aquela comunidade à salvo, Rick foi o causador dos conflitos que enfrentou. O protagonista age para manter seus dois filhos a salvo. Assim como o Governador, assim como Gareth, assim como Negan…
Mas os outros eram sádicos…
Bem, o passado do Governador e de Gareth nós já sabemos. O de Negan ainda não.
Será que Negan tentou proteger filhos também? Quando Carl e Judith morrerem, Rick ainda será o mesmo?